sexta-feira, 4 de maio de 2012

Pentecostes: tempo de comemorar 1

Em muitos povos e culturas, as festas mais importantes tinham lugar segundo o ritmo marcado pelo trabalho da terra. Neste sentido, os povos do Oriente não foram excepção: as suas celebrações eram fortemente marcadas pelos ciclos de fertilidade da natureza.

Para honrar a Deus Criador e Soberano, o Povo de Israel assume e transforma as festas do ano natural. O processo por meio do qual se realiza esta transformação, reflete a evoluação de Israel, que deixa de ser um povo unicamente ligado à natureza, para se converter num povo vinculado a história. De facto, às festas de origem agrícola foram-se juntando pedaços da vida de Israel, como razões festivas espirituais que ajudavam a reconhecer Deus presente no decurso do tempo.

Enquanto que, nas festas agrícolas, aquilo que celebravam era natural e espontâneo (esperança face à nova sementeira, alegria pela colheita), nas festas religiosas, pelo contrário, o povo de Israel celebrava intencionalmente a consagração do tempo, isto é, os eventos do passado que tinham marcado etapas-chave na História da Salvação. Em ambos os casos, tratava-se de celebrar o mesmo Deus que intervém na história e que continua a atuar na natureza. Os testemunhos que descervem como um povo muito festivo, considerado pelos seus vizinhos como um povo de bons cantores e dançarinas, confirmam este espírito celebrativo. Sinal evidente disto mesmo, é a grande quantidade e variedade de salmos e hinos que compuseram.

Parar conhecer a idiossincrasia de um povo e compreender os seus costumes, é necessário dialogar com a sua história, investigar o seu passado, partilhar o presente, descobrir os projetos que tem para o futuro. Neste sentido, entrar em contato com as suas festas e com o modo como são celebradas, aproxima-nos do seu mundo interior; do espírito que o anima. Por isso, vamos esforçar-nos por nos aproximar lentamente do povo de Israel para correr o véu do tempo e participar alegremente nas suas festividades.

Entre numerosas festas que, impreterivelmente, celebrava o povo eleito, destacam-se as três festas de peregrinação: A Páscoa (ou Festa dos Pães Ázimos); o Pentecostes (ou Festa das Semanas) e a Festa dos Tabernáculos (ou Choças, Cabanas ou Tendas). Os nomes alternativos destas festas, que colocámos entre parêntesis, são todos de origem agrícola e, portanto, anteriores ao nome e sentido religioso que preferimos realçar.

O Livro do Deuteronómio, ao fazer-lhes referência, menciona-as do seguinte modo:

«Três  vezes por ano, todos os varões se apresentarão diante do Senhor; teu Deus, no santuário que Ele tiver escolhido: na festa dos Ázimos, na festa das Semanas e na festa das Tendas. Ninguém aparecerá com as mãos vazias diante do Senhor, teu Deus, lhe tiver concedido» (Dt 16, 16-17).

A festa que mais nos interessa, neste momento, é a segunda, ou seja, a Festa do Pentecostes (ou das Semanas). A palavra Pentecostes é de origem grega e significa «cinquenta». No calendário judaico, indicava a festa que se celebrava cinquenta dias depois da festa da Páscoa.


A. Origem e sentido no Antigo Testamento

A festa das Semanas ou Pentecostes era a segunda grande festa anual que encerrava a colheita dos cereais. Para a celebrar, instaurava-se o descanso laboral, realizavam-se cerimónias em assembleias, apresentavam-se ofertas e sacrifícios voluntários.
A celebração desta festa é referida em vários escritos do Antigo Testamento. vejamos os mais significativos:

«Guardarás também a festa da ceifa, das primícias do teu trabalho, daquilo que semeaste no campo, e a festa da colheita, à saída do ano, quando recolheres  os teus frutos do campo» (Ex 23, 16)

«Contarás sete semanas a partir do momento em que começares a meter a foice nas cearas. Celebrarás, então, a festa das Semanas em honra do Senhor, com as tuas ofertas voluntárias, segundo as bençãos que o Senhor, teu Deus, te tiver concedido» (Dt 16, 9-10)

Com ó correr dos anos, às ofertas voluntárias, juntaram-se os pães com fermento, amassados com farinha de trigo, e as ofertas dos animais:
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«Depois contarás sete semanas completas, a aparr do dia seguinte ao do sábado, isto é, do dia em que tiverdes feito o rito da apresentação da gavela das espigas. Contareis até ao dia seguinte da sétima semana, isto é, cinquenta dias, e oferecereis ao Senhor uma nova oblação.
Trareis, de onde quer que habiteis, dois pães, feitos dos décimos de efá de flor de farinha, cozidos com fermento, para o rito da apresentação; serão as p´rimícias para o Senhor. Juntamente com os pães, ofereceis sete cordeiros de um ano, sem defeito, um novilho e dois carneiros; serão um holocausto ao Senhor, com as suas oblações e as suas libações, como oferta queimada de odor agradável ao Senhor. Oferecereis também um bode em reparação pelo pecado, e dois cordeiros de um ano como sacrifício de comunhão» (Lv 23, 15-18)

Estes textos não são os únicos, mas são suficientemente expressivos para nos facultar uma compreensão global do que esta festa significava para a vida do Povo de Israel e para a sua relação com Deus.

Originariamente, era apenas uma festa agrícola que celebrava a alegria pela colheita (cf. Ex 23, 16), mas desde o exílio na Banilónia (séc.  V a. C.) passou a ser uma celebração da Aliança entre Deus e o seu Povo, quando Moisés recebeu as tábuas da Lei no monte Sinai. Depois, no século anterior ao nascimento de Jesus, esta festa foi adquirindo uma enfase cada vez maior como festa de ação de graças pela Lei. a importancia atribuída a esta festa fazia de Jerusalém o centro de inúmeras peregrinações provindas das diversas colónias judaicas dispersas.

Esta identificação com a Lei possibilitava que Israel se entendesse como um Povo. A Aliança, de faco, era a chave a partir da qual podia se entender a seua relação com Deus e organizar; com base numa ética bem definida, a vida dos seus membros.

Os significados da festa do Pentecostes, como veremos, ir-se-ão modificando com o passar dos anos, segundo as situações histórias atravessadas pelo povo; isto é, serão se-significados até chegarem ao seu sentido cristão, completamente diferente do original.



Miguel Varela, Celebremos a Páscoa e o Pentecostes. Paulus: S. Paulo, 2001



No próximo, Pentecostes: tempo de comemorar 2, será abordado a "Origem e sentido da festa cristã no Novo Testamento".

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